Paula e Lucas, feitos para a eternidade
O destino é mesmo implacável.
Foi o que pensou Lucas enquanto limpou a última lágrima e se sentou no banco do carro.
Seus pais dirigiam para longe do cemitério, respeitando seu silêncio, mas sua cabeça estava a mil, e ele buscava um ponto onde se fixar dentro daquela terrível realidade.
Então, mais uma vez, o pensamento saltou para 05 de julho de 2012, o dia em que o destino havia lhe dado a oportunidade de conhecer aquela que, sem medo de errar, seria para sempre a mulher mais especial de toda sua vida: Paula Gatto.
Naquela noite, como de costume, alguns amigos o chamaram para beber no apartamento de um deles antes da festa na boate que iriam mais tarde; porém, Lucas decidiu recusar o convite para ir ajudar outro amigo, que terminara um relacionamento recentemente e não estava se sentindo bem.
Meia garrafa de uísque depois, tentando consolar uma dessas saudades inconsoláveis, Lucas acabou encorajado pela “água escocesa” e confessou ao amigo: iria à festa por causa de uma garota!
Não uma garota qualquer, mas aquela que, há algum tempo, ganhava toda sua atenção pelos corredores da UFSM.
Paula, mentalmente chamada por ele de “a musa da Agronomia”.
Depois de muitas risadas e uma boa resenha, trataram de apressar a arrumação e partiram para a balada.
Com o clima animado e a casa noturna lotada, quando toda a turma se reuniu ele sentiu que a noite seria diferente.
A certeza disso veio logo depois, quando olhou rapidamente pelo salão e viu Paula no meio da pista com algumas amigas. Seus olhos se encontraram por um breve momento e, mais uma vez, Lucas notou que algo se agitava dentro do seu peito.
Ele ainda é capaz de se lembrar perfeitamente da camisa branca e da saia preta que Paula usava naquela noite, assim como o batom rosa claro que cobria seus lábios.
Lábios aqueles muito desejados, pois, durante toda a festa, enquanto disfarçadamente observava ao seu redor, contabilizou pelo menos dezoito rapazes que se aventuraram em tirar Paula para dançar, ou, simplesmente, jogar conversa fiada em seus ouvidos. Todos dispensados com classe, como soube que ela teria.
A questão então passou a ser como ele próprio se aproximaria dela.
Seus dons de dança deviam ter ficado em outra vida, o nervosismo lhe travava um pouco as cordas vocais e o tempo parecia correr mais depressa a cada minuto.
Quando ela foi sozinha ao banheiro, já próximo das quatro horas da manhã, Lucas percebeu que aquela seria a sua “deixa” para tomar alguma atitude, e decidiu aguardar próximo ao bar onde ela passaria na volta.
Tomado por uma repentina coragem, abordou Paula, e, sem conseguir pensar em muita coisa, de início puxou assunto a respeito de um primo dela, que também era seu colega.
O papo foi se encaixando e ambos ficaram completamente absortos naquela conversa, que se estendeu até as cinco horas da manhã, quando a canseira bateu e eles decidiram ir embora.
Só então notaram que todos seus amigos já haviam ido, devido o adiantar das horas, sendo que, como Lucas ainda estava tirando sua carteira de motorista, restou a ele oferecer para que dividissem a viagem de um táxi, já que descobrira que Paula morava a apenas uma quadra de seu apartamento.
Quando o táxi parou em frente o endereço de Paula, ela se despediu e desceu.
Mas Lucas sentira desde o início que aquela seria uma noite diferente. Então, tomado mais uma vez por um ímpeto de coragem, pediu ao taxista, que já saia com o carro, para que parasse, e, imaginando-se como o protagonista de um romance que corre para dizer o que sente por sua amada, desceu e alcançou Paula antes que ela entrasse para dizer-lhe, com toda a sinceridade disponível sobre a face da Terra, o quanto era encantado por sua beleza, e agora, principalmente, pela linda mulher de alma que pudera conhecer.
O beijo foi inevitável para selar a noite mágica.
Sorrindo ela se despediu novamente e subiu para seu apartamento, deixando lá embaixo um homem bobo, feliz, encantado e completa e irremediavelmente apaixonado!
Talvez fosse uma atitude tola sair gritando pela rua em plena madrugada, mas, foi exatamente isso que ele fez. Exteriorizou a euforia misturada a paixão que já sentia por Paula, aquela mulher incrivelmente simples e, ao mesmo tempo, magnífica em todos os detalhes.
Lembrar o quanto aquilo havia sido especial ajudou Lucas a se acalmar um pouco enquanto ainda era levado para casa.
Aquela noite dera início a um namoro, baseado não apenas no amor e no carinho, mas também no mais profundo e verdadeiro companheirismo.
E um amor assim não se acaba nunca. Ele sabe.
Em casa resolveu lembrá-la disso, deixando numa foto deles no Facebook uma mensagem com aquela esperança que não podia de qualquer maneira ser morta.
Ela não conheceu o carnaval da quarta-colônia, e ele não pôde acompanhá-la até Tapera na segunda-feira seguinte. Eles não se formarão, casarão ou comprarão o apartamento dos seus planos. Não terão uma folga para irem juntos até Ivorá visitar o tio João e a tia Isa, nem passarão os finais de semana em Tapera junto com o seu Zé Gatto e a dona Simone.
As viagens estão canceladas. Davi Lucas, Joaquim, Julio Caio e Maria Luisa não irão nascer. Tudo isso perdeu nitidez em meio à fumaça do incêndio da boate Kiss, em Santa Maria, a mesma onde se conheceram.
Na mensagem Lucas pede que, ao invés da fazenda grande que teriam quando estivessem mais velhos, Paula encontre um lugar tranquilo lá no céu para poder esperar por ele. Para poderem ficar juntos quando chegar a hora.
Pois, apesar de tudo, uma coisa ainda é certa: eles vão se reencontrar.
Não há fogo que queime um amor que nasceu para arder na eternidade.
Paula e Lucas foram feitos para a eternidade.