Mamãe, vou ser político
São grandes as chances de o título dessa coluna nunca ter sido dito por nenhum filho, nem ouvido por alguma mãe.
Tios ou professores que lançam mão da célebre frase “o que você quer ser quando crescer? ”, provavelmente também nunca escutaram uma resposta assim.
Uma lástima.
Digo isso embasado no fato de que, como li certa vez nas palavras do exímio Promotor de Justiça, Dr. Sergio Clementino, “a ausência de bons interessados abre espaço para os despreparados e oportunistas”. Simples constatação.
Imaginemos agora como seria se houvesse no seio de nossa sociedade a consciência e o interesse legítimo pela política como “carreira”, no sentido de adquirir, desde a tenra idade, conhecimento e preparação para trilharmos tal caminho com responsabilidade e competência, assim como fazemos para nos tornarmos médicos, engenheiros, jornalistas, advogados, juízes, entre outros.
Se crescêssemos entendendo que a política comporta atividades de importância primordial para que áreas como saúde e justiça – tão visadas hoje pelos jovens no campo profissional – se desenvolvam, certamente teríamos um país e um mundo melhor. Pois, creio que não se trata apenas de um problema endêmico, como alguns possam imaginar, mas sim de uma pandemia global.
Parte dessa dificuldade se deve exatamente a “dominação” exercida ao longo da história por parte de alguns pérfidos governantes que alcançam o poder. Aliás, esse é o instrumento utilizado para alcança-lo.
A “tal da política” é “assunto proibido” com os amigos, familiares e demais, exatamente pela propagação da ideia de que as coisas são como devem ser e ponto. Afinal, não se pode fazer nada para que isso mude. Não somos políticos. Portanto, não há razão para se discutir o assunto.
Contudo, somos privados da reflexão de que somente os fenômenos naturais “são como devem ser e ponto”, regidos por aquilo que Aristóteles ensinou como o Princípio da Necessidade. Em suma, “necessidade” em Filosofia significa “aquilo que é do único jeito que poderia ser”.
Ocorre que a vida do ser humano é (deve ser) regida pelo Princípio da Contingência, o que, resumidamente, significa que existem outras possibilidades de existir, ou, como leciona o Dr. Clóvis de Barros Filho, acadêmico renomado da USP, “aquilo que é, mas poderia não ser”.
Eis a assertiva: se organizada da forma correta, a nossa vida pode e poderá ser muito diferente do que é, assim como a nossa convivência em sociedade.
Para tanto, temos a política.
A política que não resulta do jogo de interesses individuais e que não se resume ao senso comum de “eleição” e “administração do patrimônio público”, mas que se caracteriza na inteligência a serviço de uma convivência aperfeiçoada nos campos e nas atividades em que a inteligência pode transformar. Lição básica da Ciência Política.
Se essa ideia se espalhasse continuamente em nossa sociedade, em poucos anos poderíamos ter uma nova geração de pensamento acerca do que é política.
Talvez, houvesse saída para a situação que vivemos.
Talvez, surgissem métodos eficazes de preparar algumas pessoas para atuarem nela, e as demais para escolherem conscientemente quem nela atuará.
Talvez, um dia, algum filho tivesse orgulho em dizer: “Mamãe, vou ser político”.