E o Brasileiro pirou na Pira
Até o momento em que escrevo esta crônica parece que o povo brasileiro esqueceu por alguns dias suas mazelas. Depois de vários meses desolados, revoltados com a situação política do país, as dificuldades financeiras se agravando e a corrupção comendo solto, até a esperança e o otimismo característicos do nosso povo haviam esmaecido e, em muitos casos, desaparecido.
Cinquenta por cento da população estava contra a realização das olimpíadas e não esperavam que alguma coisa ainda desse certo neste país com complexo de vira- lata, principalmente com a violência irracional varrendo a cidade do Rio de Janeiro e fazendo com que muitos cariocas fizessem as malas e aproveitando as férias escolares fugissem da cidade chamada maravilhosa.
Mas brasileiro gosta mesmo é de festa. Não importa quem fez o gol, importante é comemorar, gritar, sacudir o esqueleto e esquecer todos os problemas. É assim que o país funciona e os governantes sabem disso.
Uma linda e quase espetacular abertura foi suficiente para que brasileiros, participantes de outros países e até mesmo a mídia nacional e internacional, se rendessem à beleza e o calor do Rio e dos cariocas.
Os artistas que estavam em baixa voltaram a brilhar representados pelos criadores responsáveis pela abertura da olimpíada na cidade das favelas, praias, morros, sujeira, violência e muita água azul do mar.
Não significa que a lagoa Rodrigo de Freitas foi despoluída, mas como Deus é brasileiro e seu filho protege o carioca com seus braços abertos, no dia em que ela (a lagoa) seria usada pelos competidores, um vento abençoado soprou e não sei se Cristo ou Netuno varreu toda a sujeira para longe dos olhos alheios e a sujeira acabou debaixo do tapete para sorte deles e nossa.
A escassez de alimentos, de água e a desorganização dos primeiros dias do evento foram esquecidos por completo (com exceção dos incorrigivelmente chatos) quando uma afro brasileira que sofreu preconceito e bullying na última olimpíada na Inglaterra, nascida na Cidade de Deus, que já foi inspiração de filme sobre o crime e a violência numa comunidade, mostrou a que veio e que bastaram mãos amigas para tirá-la do fundo do poço e projetá-la no pódio com uma medalha de ouro no peito.
E as mulheres até agora fazendo bonito e o Rio cheio de atrações, permitindo que a festa temida por tantos virasse uma das mais lindas do planeta. Eu mesma estava com medo da violência que todos esperavam para estes dias de esporte, mas já mudei de ideia e não vou resistir à curiosidade de olhar de perto, agora que estou tão perto, o show que o mundo todo esta aplaudindo de pé.
O que acontecerá depois que a festa acabar nós já sabemos. Mas isso também depende do povo carioca e brasileiro. E o Rio de Janeiro continua lindo, do Leme ao Pontal. Da zona sul à cidade de Deus.