Ivo Pitanguy, no O Pasquim

Publicado em 13/08/2016 00:08

Havia um semanário que a gente, na época da faculdade lia muito – O Pasquim, que no “anos de chumbo” foi censurado e acabou se extinguindo.
Os redatores daquele folhetim, os jornalistas Tarso de Castro, Sérgio Cabral, Millôr Fernandes Paulo Francis, Ivan Lessa, Rui de Castro, Fausto Wolf e os cartunistas, Jaguar, Ziraldo, Miguel Paiva, Claudius, Henfil e outros ases da imprensa nacional faziam críticas ao regime militar, com muita sátira e uma dose cavalar de humor inteligente. O tablóide também publicava entrevistas memoráveis com políticos, artistas e personalidades do cenário brasileiro, como por exemplo, o presidente Jânio Quadros, a polêmica atriz Leila Diniz e o gênio da arquitetura, Oscar Niemeyer.
Numa destas clássicas entrevistas, o médico Ivo Pitanguy, ícone da cirurgia plástica em todo mundo participou e veja o que ele já pensava como cidadão e profissional da área da saúde, em 1973, isso há 44 anos…
Millôr – Ivo Pitanguy, de todos os homens deste país que já tem aproximadamente 100 milhões, eu considero você o mais realizado. O que você diz a respeito disso?
Pitanguy – Eu não tenho nada de sucesso. Acho o sucesso uma coisa que, na realidade, ninguém persegue. O negócio é que eu gosto do que faço e tudo que eu faço me identifica com o que eu faço. Eu continuo hoje da mesma forma como comecei a medicina: tenho as mesmas amarguras, as mesmas incertezas. Apenas sei o que estou fazendo, o que eu gosto de fazer, e faço com a mesma intensidade.
Jaguar – Eu não persigo o sucesso porque eu não sei pra que lado ele foi.
Pitanguy – Eu não escolhi uma profissão porque a profissão é de sucesso. Eu escolhi uma profissão que naturalmente veio a mim. Em qualquer profissão o problema é o mesmo.
Ziraldo – Você não percebeu que a cirurgia plástica era o seu caminho não, né? Você foi levado a ela.
Pitanguy – Não, não. Ninguém faz isso não. Eu acho que qualquer coisa que a gente faz, a gente é levado aos poucos por forças instintivas que nós temos. O que acontece hoje em todas as especialidades humanas é isso.
Ziraldo – Você foi o primeiro especialista do Brasil?
Pitanguy – Não, nunca ninguém é primeiro especialista em coisa alguma. Eu tenho impressão que talvez o que eu tenha feito no Rio de Janeiro, de certa forma, é ter procurado dar a ela um sentido diferente. Quer dizer: eu coloquei a cirurgia estética e a cirurgia reparadora como uma única especialidade, sem separá-las.
Ivan Lessa – Você tem discípulos da Cortina de Ferro?
Pitanguy – Já tive vários. Tenho uma grande troca de correspondência, já dei conferências na Rússia, em Leningrado, Moscou, e já treinei aqui pessoas vindas da Áustria. E a Rússia depende do intérprete. Eu falo seis idiomas patrioticamente.
Millôr – Como é que se faz no momento a cirurgia plástica no Brasil, no sentido de extensão de prática e qualidade de prática?
Pitanguy – Eu acho que o brasileiro é muito dotado para a medicina porque ele é delicado, tem bom trato e se interessa pelo ser humano. Não sei se vocês concordam com isso, mas é uma qualidade que eu acho fundamental.
Sérgio – O que o Ivo Pitanguy tem? Casas, ilhas, barcos, quadros, armas, cães de raça, avião a jato, cascatas na sala?
Pitanguy – Não tenho avião e não tenho navio. Eu não tenho fortuna. A minha fortuna são meus amigos e o meu bem-estar. Eu vivo bem e ganho bem.
Esta é uma homenagem ao nosso herói de hoje, um homem além do seu tempo que conseguiu mudar o conceito de beleza plástica ao produzir na humanidade uma beleza interior imune à desvairada velhice.

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