Rolando Boldrin
A Cultura Brasileira perde o contador de ‘causos’ Rolando Boldrin, aos 86 anos. O nosso herói de hoje foi ator, cantor, compositor e apresentador de programa de música regional na televisão.
Rolando Boldrin contava causos como quem ponteia a viola fazendo a gente saborear o modo gostoso de uma boa prosa. E as palavras iam saindo assim, melodiosas, através de histórias onde não faltavam humor e saudável malícia, mas sempre com o traço singelo que marca nossa cultura rural.
Agora, morando no Céu, ele nos manda um causo inédito que transcrevo: “Existiu um personagem das antigas piadas de salão que se chamava ‘Mané Joaquim’, conhecido por meio-mundo devido à sua imensa burrice. Tinha dificuldade de entender as coisas mais simples; ria com retardo da anedota mais besta; tudo que era compreendido por qualquer criança, era muito difícil para ele. Foi a Juazeiro na Bahia visitar o túmulo do Padre Cícero e, ao saber que estava enterrado no Ceará, perguntou: – ‘Isso é um pade ou um peba?’. Um dia Mané Joaquim foi a uma grande cidade, perto da dele, para conhecer um shopping e ficou maravilhado com as lojas e os produtos à venda. Antes de entrar em alguma loja, conferiu se não havia alguém da sua cidade por perto, para evitar ser alvo de alguma pilhéria, uma gozação. Tudo ok, ele entrou numa filial das Casas Bahia e se engraçou com um eletrodoméstico. Chamou um vendedor e perguntou: ‘Moço, faz favor, quanto que custa essa televisão?’. O rapaz deu um risinho e disse: ‘Está por mil e quinhentos reais, mas para você, Mané, eu faço mil e trezentos’.
Ele tomou um susto por ter sido identificado e saiu. Ficou matutando como o cara o reconheceu. Foi ao banheiro, botou um casaco, raspou o bigode, colocou óculos escuros e voltou, chamando o mesmo vendedor. Qual o preço do televisor?’. E a resposta: ‘mil e quinhentos, mas pra você, Mané, é só mil e duzentos’. Ele conteve a raiva e saiu esbaforido em direção ao banheiro do shopping. Botou roupas femininas, uma peruca loura, óculos enormes de perua, sandália plataforma e voltou à loja: ‘Bom dia, senhor, qual o valor dessa pequena TV?’. O vendedor, na maior cancha: ‘Ah, pois não, custa apenas mil e quinhentos reais, mas para Mané Joaquim sai por mil e cem. Vai levar?’. Ele explodiu: ‘Levar uma porra! Me diga só como diabos você sempre sabe que sou eu?’. E o vendedor, com uma cara de juiz do supremo, quase às gargalhadas disse: ‘Ora, Mané, num raio de cem quilômetros a partir do shopping, só você para não ver que isso aqui não é uma televisão e sim um micro-ondas’. Na burrice e noutros defeitos, não cabe uma maquiagem”.