Volta por cima

Publicado em 1/03/2025 00:03

É bem possível que o zoólogo e compositor Paulo Emílio Vanzolini, autor de “Ronda”, música hino da cidade de São Paulo e do Brasil, compôs “Volta por cima”, sucesso nacional nas rodas de samba, quando esteve aqui na Terra das Araras Azuis. A inspiração aconteceu no Hotel Municipal.
Naquela noite, Osmar Novaes e Ditão Pintor acompanhavam a grande personalidade científica nacional e, ao mesmo tempo, expoente maior da música popular brasileira, na época.
O bandolim de Osmar Novaes encantava as pessoas presentes no recinto. Alguns diziam que ele era muito estranho, outros, sobrenatural. É por que ele gostava da verdade e falava sem medo de desagradar alguém. O único medo que tinha era de tirar sangue, pois como sempre dizia – minha veia é muito delicada…
No momento que solava “Tico-tico no fubá”, a sua favorita, um barulho metálico interrompeu o devaneio da plateia. As duas primeiras cordas do bandolim de Osmar Novaes se arrebentaram.
Ditão Pintor parou o acompanhamento. O pessoal da batucada parou.
O público parou, mas Osmar Novaes continuou a solar a música de Zequinha de Abreu, metendo breves e semibreves, fusas e semifusas, colcheias e semicolcheias fazendo o som voar na atmosfera boêmia daquela noite com o toque daqueles dedos encantadores.
Mal o público se acalmou, quando, de repente, outro som perturbador despertou a atenção dos assistentes. Uma outra dupla de corda do bandolim do Osmar Novaes também se rompeu.
Ditão Pintor parou de novo. A percussão da moçada também. Assim como a respiração da plateia. Mas Osmar Novaes não parou. Como se nada tivesse acontecido, Novaes esqueceu as dificuldades e avançou tirando um som quase impossível. Todos impressionados voltaram a acompanhar o nosso herói, quando uma outra dupla de cordas se partiu.
O Ditão Pintor deu um breque. O grupo de percussionistas idem. Silêncio na batida do coração da rapaziada. Mas Osmar Novaes, não. Como se fosse um contorcionista musical, tirou todos os sons da única dupla de cordas que sobrara até terminar a sua música predileta com galhardia.
Foi naquele momento mágico que a sensibilidade de Paulo Vanzolini se aguçou e não teve como não compor “Volta por cima” que entre as estrofes famosas tem aquela – “levanta sacode a poeira e dá volta por cima”: Serve para todo mundo, aquele que recebeu um fora da namorada, outro que tem de pagar um endosso de um amigo da onça ou até quem recebeu título de “persona non grata”. Desperte o Osmar Novaes que existe dentro de você e avance para vencer. A vitória é a arte de você continuar de cabeça erguida. Nunca a vida quebrará todas as cordas. A última corda existe para a gente aprender de novo, para deslumbrar a nossa sabedoria e gerar soluções. Tocar a derradeira corda, na essência, é acreditar em si mesmo!

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