A força na fraqueza
A lição do ferreiro
Existiu, em certa época, um reino que era o mais rico e poderoso do mundo.
As terras eram férteis em todo lugar, as águas eram abundantes por toda a volta, e as mesas eram fartas até mesmo entre a maioria dos camponeses.
Apesar da grande prosperidade, o rei estava deveras preocupado, pois sentia que seu povo, ainda assim, não era, de fato, feliz.
Em uma rápida decisão, reuniu seu conselho e ordenou que fosse noticiado por todo aquele lugar que, o homem que se apresentasse perante ele alegando ser o mais feliz do reino, e justificasse o motivo de sua felicidade, passaria a ser dono de riquezas e posses jamais imaginadas.
Duas semanas se passaram e, surpreendentemente, nenhuma pessoa, homem, mulher ou criança, havia se apresentado ao rei.
Quando esse já começava a se desesperar com aquela estranhíssima situação, foi noticiado que no salão real havia um homem para apresentar-se como o mais feliz, bem como para se justificar.
Ansiando por algum dizer que desse a ele uma ideia de o que fazer pelo seu povo, e esperando que esse se empolgasse com as palavras daquele homem, ordenou que todos, da mais alta até a mais baixa classe, fossem chamados para presenciar a explicação.
Ao sentar-se em seu trono, diante do salão lotado, o rei sentiu uma grande surpresa ao perceber que, ao contrário do que esperava, quem estava ali para se justificar não era um senhor de terras, comerciante bem sucedido ou mulher de bela feição, mas um simples ferreiro, que, devido ao seu ofício, até mesmo um pouco sujo estava.
O silêncio tomou conta de todos, e então o rei disse-lhe:
– Apresente-se formalmente e me diga o que lhe faz se declarar perante todos como o mais feliz de todo o reino.
Sorrindo, e com uma respeitosa reverência, o homem começou a dizer:
– Muito prazer, Vossa Majestade. Meu nome é João e sou o ferreiro do reino, assim como meu pai e meu avô um dia foram. Sou o homem mais feliz desse lugar. Não sou de família nobre. Não tenho terras, nem nada que plantar nelas. Não possuo servos, moedas de ouro, ou roupas finas. Tenho sempre o que comer, mas nunca me sentei a uma mesa farta. Quando partir desse mundo, a maioria das pessoas esquecerá o meu nome. Não deixarei propriedades para minha esposa ou filhos, e, possivelmente, assim como eu, eles serão homens simples. Talvez, até mesmo, ferreiros.
A curiosidade estava estampada em todos os rostos no salão, e o rei, após refletir sobre aquilo que ouvira, então se pronunciou:
– Estás zombando de mim, ou são realmente esses os motivos da tua felicidade? Explique-me melhor sobre o que lhe faz feliz nisso tudo.
– Perdão, Vossa Majestade, mas disse-lhe apenas a verdade. Não sou de família nobre, mas meus pais me deram a educação mais honesta que eu poderia querer. Não possuo terras, servos, ouro ou roupas finas, mas sou aquele que fabrica as ferramentas utilizadas em todas as terras e plantações. É através delas que se iniciam as mesas fartas dos senhores nobres, e o sustento dos servos que nelas trabalham. O ouro que chega até as mãos dos comerciantes, sempre terá um pouco do suor que derramei para fazer as ferramentas de seus compradores. A minha mesa não é grande ou farta, mas nela cabe toda minha família, e é nela que matamos nossa fome de alimento, e também de afeto. Quando partir, realmente não serão todos que lembrarão o meu nome, mas aqueles, próximos a mim, que são os que realmente importam, o terão para sempre em suas mentes. Eu fiz a armadura e a espada dos soldados que protegem a tua vida, e construí até mesmo o berço onde hoje dorme o teu filho. Ele, um dia, será poderoso, e, assim, como Vossa Majestade, também será lembrado como rei. Para minha família, eu sou honestamente o rei do meu lar, e nada neste mundo poderia me deixar mais feliz do que isso, pois esse é o meu legado.
Recusando gentilmente todas as riquezas que o rei, perplexo, lhe ofereceu, o ferreiro seguiu então com sua vida simples, porém, feliz.
A partir daquele dia, todo o reino aprendeu uma importante lição: ferreiro ou rei, todos têm determinada importância nesta vida, portanto, nunca se deve subestimar ao próximo, ou a si mesmo.
A coroa de todo rei nasce no molde de uma enxada.