Com a alma
Sentou-se na cama com o caderno no colo e então pensou: o que escrever para ela?
Complicado demais. Tantas coisas que às vezes tentava dizer e sentia ficar preso em sua garganta, que num triste engano achara que encarar o papel ajudaria a resolver. Que nada!
A questão era que, dizer algo sobre alguém que ele vivia conhecendo algo novo e magnífico a todo momento, tornava-se praticamente impossível.
“Como ela é?”, seria um tipo de pergunta que responderia de dez maneiras diferentes dentro de dez dias. Todas progressivamente melhores.
Não é daquelas que se pode prever ou formular estereótipo após um breve período de convivência. É mutável, adaptável, incrível. Amável? Com toda certeza sim, pois era isso que sentia cada dia mais por ela. Amor.
Mas não haviam dito que aquilo era coisa de cinema? Que as mulheres não gostavam de quem lhes desse valor? Que os casais atuais estavam perdidos? Pois é, mitos quebrados por ela.
Essa mulher que quando está por perto consegue prender não a a atenção, os olhos e ouvidos, mas todos os demais sentidos que um homem tem, até mesmo os que ele nem sabe que possui. É que ela toma para si, imperceptivelmente, todas as chances que alguém possa ter de resistir a seus encantos. Essa é a verdade.
Quando está longe? Aí complica ainda mais em ser dito, pois ele sabe, é excessivamente complexo descrever o que se torna a soma de querer tê-la por perto, com a distância que não perdoa.
Saiu então da cama e foi para o computador, com a mente cheia e a folha em branco. Esboçou iniciar uma mensagem com aquilo que rapidamente lhe vinha a cabeça no momento, mas, em pouco tempo, percebeu que a madrugada seria pequena se tentasse dizer metade do que sentia.
Então decidiu o que faria.
Quanto ao texto alusivo aos dois meses que estavam juntos, nada.
Quanto a ela, que gostaria de permanecer junto pelo resto da vida, tudo.
Mesmo que quando a encontrasse as palavras teimassem em sair novamente, percebeu que aquilo que tem na mente, é muito menor que aquilo que tem no coração. Entendeu que a boca pronunciava coisas lindas, mas que os olhos recitavam poesias e eram a melodia de toda canção.
Percebeu que estava escrevendo em terceira pessoa, rimando, e então riu, pois havia voltado a escrever com a alma, e não apenas com as mãos.