O meiostream

Publicado em 15/10/2016 00:10

No Podcast Café Brasil 525 Empreende Dor, fiz uma série de afirmações sobre o desafio de empreender no Brasil:
Empreender dói; empreender não é pra todo mundo; empreender não é apenas abrir um negócio próprio; empreender é MUITO mais difícil do que você pensa; o ambiente de negócios no Brasil é um dos mais áridos do mundo, você será sócio do Estado, que levará mensalmente boa parte dos recursos que você obteve ou tem guardado; as chances de dar errado são infinitamente maiores que as de dar certo; dificilmente você chegará a algum lugar oferecendo mais do mesmo. Quer aumentar as chances de dar certo? Estude antes de empreender, se prepare, viaje para o futuro e de lá olhe para o presente.
O retorno daquele programa foi espetacular. Recebi comentários suficientes para mais um ou dois programas. Parece que temos uma quantidade imensa de gente preferindo manter os pés no chão à cabeça nas nuvens. Uma das conversas com amigos envolveu os desafios do empreendedorismo no mundo da música, e ouvi um termo que acabou por resumir tudo aquilo que tenho tentado expressar. Falávamos que a discussão do empreendedorismo no mundo da música está sempre focada no “mainstream”, a área onde transitam os artistas que atingiram o megasucesso.
– Se deu certo com o Sepultura, vai dar certo comigo.
– Se a Anitta conseguiu, eu também consigo.
O outro lado da moeda está no underground, a região onde circulam os artistas completamente fora das mídias de massa, que precisam de outras profissões para sobreviver. São os carteiros, os padeiros, as secretárias, as enfermeiras, o comissário de bordo, o professor, a bancária, que nas horas vagas conseguem estudar, ensaiar, se apresentar aqui e ali a duras custas, pelo puro amor à arte.
Discutíamos o oito e o oitenta quando, entre o mainstream e o underground, surgiu o termo que eu buscava: o meiostream.
No meiostream estão os milhões que, embora não tenham atingindo o sucesso milionário, conseguem viver de sua arte com dignidade, com tribos de fãs fiéis e desenvolvendo o trabalho que amam com competência e tesão.
É isso! Meiostream! A maioria dos empreendedores sérios que encararem o desafio de investir em seus sonhos, provavelmente viverá a vida no meiostream, batalhando duro sem jamais conseguir comprar um iate, um avião, um apartamento em Paris. Nunca se apresentarão para dezenas de milhares de fãs, não estarão na novela da Globo, não serão reconhecidos nas ruas, não serão entrevistados nos programas de economia, não serão capa da Exame nem se transformarão em cases de sucesso a serem estudados pelas escolas de empreendedorismo. Serão nada mais que pais e mães empenhados em conseguir educar os filhos, em pagar suas contas, em manter seu crédito em dia… gente da classe média. Alguns da média alta, outros da média média, mas nenhum milionário. Sem glamour, sem baba ovos, sem visibilidade.
E o mais interessante: muitos deles perfeitamente confortáveis em permanecer no meiostream. Eles sabem que o preço pago por quem está no mainstream é a perda do controle sobre sua arte e, em última instância, a liberdade. Outros meiostreamers consideram que estão obtendo o suficiente, não precisam de milhões de fãs nem de centenas de colaboradores, não precisam vender sua start up por bilhões de dólares, não precisam ter dois disto, três daquilo… Consideram que são bem sucedidos sendo o que são e como são.
Será que isso não é conformismo? Não acho. Acho que é equilíbrio, é a capacidade de calibrar seus esforços, de estabelecer seus limites e, dentro deles, sentir-se realizado. Isso é uma bênção.
Me identifiquei imediatamente. Sou parte do meiostream.
É possível ser feliz nele.

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