MATANÇA, NÃO! CACHORRO, QUANDO COLOCADO EM TRATAMENTO, PODE DEIXAR DE TRANSMITIR A LEISHMANIOSE
No ano passado, um veículo oficial da Prefeitura de Castilho, quase na divisa de SP com MS, anunciava que cães com leishmaniose precisavam ser entregues para o CCZ (Centro de Controle de Zoonoses). A prática é recorrente durante 2022 e 2023. Todo morador da cidade sabe o motivo. Eutanásia.
Engana-se quem pensa que é uma política somente para cachorros abandonados. Diego, de 21 anos, revela sua história. “Fizeram exame no meu cachorro e me obrigaram a entregá-lo. Falaram que se alguém da rua ficasse doente a responsabilidade seria minha. Fiquei com medo e deixei levar o bichinho”, conta.
“Prefeitura de Castilho fazendo campanha pesada para sacrificar nossos pets. Basta! Ser ignorante pode ser uma opção individual. Ser desatualizado e desumano, já é falta de inteligência e de amor”, escreveu o vereador Adilson Santos.
À época, em publicação oficial, o secretário de Saúde, Demilson Cordeiro da Silva, afirmou o seguinte. “O maior problema é que esse animal continua sendo um risco não apenas para os outros animais da casa, mas principalmente para quem mora na residência e também para os vizinhos, pois o mosquito pica um cão contaminado e sai voando, podendo depois picar toda a vizinhança”.
NÃO É O QUE DIZ A CIÊNCIA
Fábio Santos Nogueira, o doutor Leishmaniose, uma das maiores autoridades do país no assunto e que usa o Instagram para divulgar dicas que desmistificam a doença (@drleishmaniose) revelou à BBC Brasil que existe tratamento.
“Existem vários fármacos leishmanicidas para o tratamento da leishmaniose visceral, seja nas pessoas ou nos animais, sendo os mais utilizados os antimoniatos, anfotericina B e a miltefosina”.
O veterinário explica ainda que o cachorro, quando colocado em tratamento, pode deixar de ser um transmissor. “A miltefosina está liberada para o uso nos cães, através de uma portaria interministerial de 2016. Temos também algumas drogas leishmaniostáticas e imunomoduladoras que podem ser utilizadas nos animais e com uma boa resposta clínica. Importante esclarecer que a leishmaniose é uma doença de difícil cura parasitológica estéril, seja nas pessoas ou nos animais. Com o tratamento, podemos obter a melhora clínica, redução da carga parasitária, controle da resposta imunológica e consequentemente o bloqueio da transmissão”, garante.
MATANÇA
Sobre as mortes de animais, o doutor Fábio é taxativo. “A eutanásia como forma de controle da doença é uma página que já foi virada da nossa história. Ela surgiu em 1963 através de um decreto presidencial que visava o tratamento gratuito das pessoas infectadas, o controle do vetor e a eutanásia dos animais doentes. No entanto, durante todos esses anos se mostrou ineficaz e custosa, com aumento do número de casos e disseminação para novas áreas”.
NAZISMO
Por defender que seja abandonada a prática, o veterinário se envolveu em uma polêmica com a Prefeitura de Castilho. Morador de Andradina, cidade vizinha, ele fez dura postagem em seu Instagram, comparando o modelo do município ao nazismo durante a Segunda Guerra Mundial.
A postagem, porém, não está mais disponível. O próprio veterinário explicou em um story divulgado à época, que apagou o post por pedido do então prefeito da cidade, Paulo Duarte Boaventura (MDB). O médico concordou em retirar as críticas porque soube que o político e sua família passaram a receber ameaças.
Questionada pela BBC Brasil sobre o caso e a prática de eutanásia, a Prefeitura de Castilho não enviou resposta. BBC Brasil.